A COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO SEGUNDO A EC 45/2004
Alexandre Nery de
Oliveira
Desembargador do
Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região
Professor de Processo
do Trabalho do IESB
Pós-Graduado como
Especialista em Teoria da Constituição
Após
debates que chegaram a ameaçar a própria existência da Justiça do
Trabalho, a Reforma do Judiciário que tramitou no Congresso Nacional
evoluiu para consagrar, com a promulgação da Emenda Constitucional
nº 45, de 08 de dezembro de 2004, vigente a partir de 31 de dezembro
de 2004, quando publicada, não apenas a permanência desse ramo
especializado do Poder Judiciário como a ampliação de suas
competências constitucionais, conforme nova redação dada ao 114 da
Constituição Federal.
a) competência
ampla envolvendo relação de trabalho, sob qualquer regime legal
(art. 114, inciso I):
Há que se notar, desde
logo, que a Justiça do Trabalho teve, em relação ao modelo
original da Constituição de 1988, alterado o eixo competencial da
relação de emprego e seus partícipes (apenas analisando as
controvérsias decorrentes da relação de trabalho quando autorizada
por lei) para a definição primordial da competência a partir da
relação de trabalho, assim em sentido mais amplo, para alcançar
todas as controvérsias envolvendo o trabalho humano que não se
encontrem excepcionadas pela própria Constituição Federal.
Aliás,
com a definição de um regime jurídico único para os servidores
públicos, desde 1988 se discutia se as relações trabalhistas
firmadas sob regime administrativo não seriam da competência da
Justiça do Trabalho, o que acabou sendo expressamente consignado no
Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União, em 1990, em norma
depois declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal,
quando definiu que o anterior artigo 114 da Constituição apenas
contemplava relações de emprego e não relações de trabalho, pelo
que as discussões administrativas envolvendo os servidores públicos
não seriam da competência da Justiça do Trabalho, discussão que a
EC 45/2004 parecia suplantar com a redação mais extensa a alcançar
todas as relações de trabalho. No entanto, ao apreciar a ADI
3395/DF, o STF, primeiro por decisão liminar do então Presidente,
Ministro Nelson Jobim, e depois confirmada pelo Pleno, acabou o
Excelso Pretório por dar uma paradoxal interpretação conforme à
Constituição de Emenda Constitucional, sem revelar discussão
acerca de tema vedado como cláusula pétrea ou redução de contexto
por conta de norma constitucional inequivocamente contrária ao texto
da nova redação dada ao artigo 114, mas com base em precedente
anterior que apreciara inconstitucionalidade de ampliação
competencial decorrente de preceito contido no Estatuto dos
Servidores Públicos Federais, denotando atuação mais política do
que jurídica da interpretação equivocada, já que se pretendeu
adiantar ao contexto da PEC 358/2005 – a Emenda Paralela da Reforma
do Judiciário, que envolvendo temas pendentes por não analisados em
ambas as Casas do Congresso, acrescia exceção ao artigo 114, I, da
Constituição para assim expressamente excluir da competência da
Justiça do Trabalho as causas envolvendo servidores públicos.
Mesmo com tais reduções
competenciais decorrentes do comando interpretativo contido na
liminar concedida na ADI 3395/DF, outras questões emergem do contido
no artigo 114, inciso I, da Constituição, conforme EC 45/2004,
inclusive com efeitos noutros incisos do referido artigo
constitucional.
A mais colocada tem sido
a discussão quanto ao trabalho de autônomos, sobretudo quando
contraposto em relação ao Direito do Consumidor.
O artigo 114, inciso I,
da Constituição Federal, passa a dispor que são da competência da
Justiça do Trabalho todas as causas oriundas da relação de
trabalho, excetuadas, agora, por conta da ADI 3395/DF, enquanto
vigente a liminar concedida, apenas as que tenham por partes o Poder
Público e servidores ocupantes de cargos criados por lei, de
provimento efetivo ou em comissão, que denotam relação
institucional de ordem estatutária ou de caráter
jurídico-administrativa.
Noto, no particular da
relação envolvendo profissionais autônomos, que a CLT, na linha da
outorga de competências correlatas decorrentes da anterior redação
do artigo 114 constitucional, já atribuía, como ora atribui, à
Justiça do Trabalho a competência para processar e julgar as causas
envolvendo as pequenas empreitadas, a par de reguladas em essência
pelo Código Civil. Nisso, o diferencial da EC 45/2004 foi alargar o
campo das atividades para envolver todas as modalidades de serviços
autônomos, sempre que envolvido num lado o trabalhador,
independentemente dos valores ou serviços contratados ou da
qualificação dos profissionais, afastadas apenas as discussões em
que sejam partes exclusivamente pessoas jurídicas ou em que o
contratado prestador dos serviços não seja pessoa física.
Percebe-se, pois, que todas as relações de trabalho descritas pelo
vigente Código Civil, em que o serviço ou empreitada sejam
realizados por pessoa física, são da competência da Justiça do
Trabalho, a teor do artigo 114, inciso I, da Constituição Federal,
que não tem perda competencial pela origem do vínculo, como antes
já decidira o Supremo Tribunal Federal.
Como diferenciar,
contudo, a relação de trabalho de competência da Justiça do
Trabalho da relação de consumo de competência da Justiça Comum?
As
relações de consumo encontram-se reguladas pela Lei nº 8.078/1990,
que instituiu o Código de Defesa do Consumidor (CDC), a teor dos
comandos do artigo 5º, XXXII, da Constituição Federal, e do artigo
48 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, revelando
que o objeto é a proteção do consumidor perante o fornecedor de
produtos ou de serviços. Por conta disso, toda a discussão perante
a Justiça envolvendo relação de consumo, a teor do artigo 81 e
seguintes do CDC é pertinente a ter o consumidor ou a vítima do
objeto do consumo como parte ativa ou interessada no processo
individual ou coletivo promovido contra o fornecedor do bem ou do
serviço questionado. Sempre que tal for o objeto da controvérsia, a
competência é da Justiça Comum porque o que se discute, em
essência, é a correção ou a qualidade do produto ou do serviço
adquirido, ou a existência de vício, defeito ou falta de regular
entrega conforme ajustado ou anunciado para a aquisição pelo
consumidor. Doutro lado, as relações de trabalho encontram-se
reguladas na Consolidação das Leis do Trabalho e ainda no vigente
Código Civil (- prestação de serviços: artigos 593-609; -
empreitada: artigos 610-626; - depósito profissional: artigo 628,
parte final; - mandato: artigos 653-691; - comissionamento: artigos
693-709; - agenciamento e distribuição: artigos 710-721;
corretagem: artigos 722-729; - transporte: artigos 730-756), sempre
que a atividade tenha sido desenvolvida por trabalhador,
independentemente da condição de empregado, autônomo, avulso,
empreiteiro ou profissional liberal, se age em contraprestação a
uma remuneração pelo trabalho desenvolvido, independentemente da
qualificação do valor percebido pelo tomador dos serviços
desenvolvidos ou deste próprio, baseado na utilização de suas
capacidades físicas ou intelectuais para a realização de certo ato
exigido ou ajustado. Ou seja, no âmbito da relação de trabalho, a
discussão perante a Justiça envolve a defesa do trabalhador, ainda
que sem subordinação direta ao tomador dos serviços, de modo a
garantir a integridade e dignidade do ser humano na contraprestação
do trabalho em troca dos alimentos necessários a sua subsistência e
à de sua família.
Quando o objeto da
controvérsia, portanto, é o trabalho e não seus resultados em
relação ao tomador dos serviços, a competência para a causa é da
Justiça do Trabalho, a teor do artigo 114, inciso I, da Constituição
Federal. Se o objeto da controvérsia, doutro lado, ainda que
decorrente do trabalho, é o serviço prestado pelo profissional, em
demanda promovida pelo tomador, na qualidade de consumidor, a
competência para a causa é da Justiça Comum, porque a discussão
não é o trabalho, mas o resultado questionado pelo consumidor.
A discussão, portanto, é
distinta quando envolve o trabalho ou o produto ou serviço
consumido. Nesse particular, as discussões, centradas exclusivamente
no trabalho ou no consumo, e assim tendo como autores da demanda o
trabalhador (profissional autônomo ou o empreiteiro) ou o
consumidor, respectivamente, repercutem em causas da competência da
Justiça do Trabalho ou da Justiça Comum, nesta ordem.
A
questão competencial merece maior reflexão quando a discussão
submetida a um ramo judiciário passa a resvalar em tema próprio do
outro. A vis
attractiva
contida no artigo 265, § 5º, parte final, do CPC, pois, resulta
também noutro efeito similar quando não houver processos em curso
simultaneamente na Justiça do Trabalho e na Justiça Comum a
discutir, respectivamente, a relação de trabalho e a relação de
consumo derivada do mesmo fato, mas a questão conexa estiver, como
antes descrita, submetida ao Juízo como matéria de defesa. Nesse
caso, a questão incidental decidida pelo Juízo que não seria
competente para a controvérsia nela contida, mas que resta coligada
à questão principal contida na lide regularmente submetida perante
o Juízo competente, é por este apreciada sem os efeitos de coisa
julgada, conforme resulta do artigo 469, inciso III, do CPC, sendo
tal conclusão razoável a partir da lógica que decorre do artigo
470 do CPC que traduz a possibilidade de dar-se efeito de coisa
julgada à decisão da questão prejudicial. Isto porque, ao admitir
os efeitos de coisa julgada apenas se o juiz for competente, em
contrapartida à negação anterior contida no artigo 469, III, o
artigo 470 do CPC acaba por enunciar a possibilidade de a questão
prejudicial ser julgada por Juízo incompetente, se necessária para
a resolução da lide. Ou seja: apenas o efeito da coisa julgada será
negado à discussão trabalhista apreciada como questão de defesa
suscitada em relação de consumo perante o Juízo Comum, ou
vice-versa, será negado tal efeito à solução dada quanto à
questão incidental de consumo surgida como tema prejudicial da
defesa quanto à relação de trabalho submetida à tutela
jurisdicional do Juízo do Trabalho.
Nesse aspecto fundamental
da ordem constitucional regulada segundo as normas processuais, as
competências se firmam sem que quaisquer dos Juízos iniba a
competência do outro, ainda que venha a apreciar, como questão
prejudicial para a solução da causa de sua competência, tema ou
fato que estaria, propriamente, sujeito à jurisdição diversa, pela
matéria, eis que de tal pronunciamento necessário não emerge o
efeito de coisa julgada próprio das sentenças judiciais, que será
restrito à matéria para a qual competente o Juízo prolator da
sentença. A exegese, pois, do artigo 265, IV, “a” e “b”, e
parágrafo 5º, combinado com os artigos 469, III, e 470, do Código
de Processo Civil, permite enunciar a competência da Justiça do
Trabalho para apreciar as questões decorrentes do trabalho, ainda
quando contrapostas a questões civis, especialmente as de consumo,
que lhes sejam submetidas em caráter incidental ou por via de
defesa.
b) competência
quanto à discussão de exercício do direito de greve (art. 114,
inciso II):
A
EC 45/2004 descreveu, no âmbito constitucional, o que já se
encontrava parcialmente delineado na legislação trabalhista acerca
das discussões envolvendo o exercício do direito de greve. Agora,
mais que antes, por norma de cunho supremo, fica descrita a
competência da Justiça do Trabalho para declarar a abusividade ou
não do exercício do direito de greve. No entanto, a inserção do
dispositivo, embora simplória, carrega consigo outra discussão, a
partir da análise sistemática da Constituição Federal, conforme
delineada, sobretudo, pela Emenda Constitucional nº 45/2004.
Com efeito, considerado o
direito de greve tanto no setor privado quanto no setor público, e
por consideração da amplitude das discussões envolvendo a relação
de trabalho entregue à jurisdição da Justiça do Trabalho, emerge
que não mais se admite excluir da análise especializada as
controvérsias que envolviam greves instauradas no âmbito da
Administração Pública.
Contudo,
novamente o STF, a partir do que fora antes julgado na ADI 3395/DF,
ao analisar injunção alusiva ao direito de greve dos servidores
públicos, acabou por enunciar, também, regra competencial, assim
entendendo que as greves envolvendo servidores públicos deveriam ser
julgadas pelos Tribunais de Justiça, pelos Tribunais Regionais
Federais ou pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme o ente
público a que vinculados e segundo a amplitude do movimento
paredista, parecendo cometer, novamente, o Excelso Pretório o
equívoco na redução de texto constitucional, sobretudo porque as
competências do STJ e de TRF são expressamente enunciadas pela
própria Constituição Federal e não se compreende não estivessem
ali previstas, então, as hipóteses enunciadas no julgado, sobretudo
ao instante em que feita letra morta ao substrato jurídico emanado
do artigo 114, II, da Constituição.
Cabe
notar que da regra para os dissídios coletivos, contida nos
parágrafos 1º a 3º do artigo 114, apenas o parágrafo 3º tem
correlação com o artigo 114, II, da Constituição, enquanto os
demais complementam a própria regra contida no caput, ou assim no
artigo 114, I, eis que no conceito de “ações
oriundas da relação de trabalho”
encontram-se tanto os dissídios individuais como os coletivos, mas
não necessariamente a discussão envolvendo a greve deve culminar
noutros efeitos próprios dos dissídios coletivos em geral. Em
verdade, o artigo 114, II, da Constituição enuncia uma verdadeira
ação declaratória sobre o estado do movimento paredista, para que
se enuncie a legitimidade ou não da greve potencial ou efetiva, não
por menos podendo traduzir-se em pedido incidental doutras ações de
competência da Justiça do Trabalho, não sendo, pois,
necessariamente, pela via do dissídio coletivo. Por sua vez, o
parágrafo 3º do artigo 114 apenas complementa a regra para
estabelecer uma legitimidade especial ao Ministério Público do
Trabalho quando a greve ocorrer em atividade essencial com
possibilidade de lesão ao interesse público, enquanto, nas demais
hipóteses, os envolvidos diretamente na greve, sejam empregados e
empregadores, sejam servidores e Poder Público, poderão provocar a
manifestação da Justiça do Trabalho para dizer sobre a
regularidade do exercício do direito de greve exercido pelos
trabalhadores em geral ou pelos servidores em particular.
Não por menos, nessa
compreensão o próprio STF acabou por concluir, inclusive mediante
súmula, que as ações possessórias decorrentes de movimento
paredista são da competência da Justiça do Trabalho, no particular
tendo o TST enunciado serem tais demandas possessórias de
competência dos Juízos do Trabalho de primeiro grau.
c) competência
para as controvérsias sobre representação sindical ou causas
envolvendo sindicatos, sindicatos e patrões ou sindicatos e
trabalhadores, nessa qualidade (art. 114, inciso III):
A EC 45/2004
constitucionalizou o contido no artigo 1º da Lei nº 9.028, de 12 de
abril de 1995. Ampliou-se, agora, a regra legal referida, para
também atribuir à Justiça do Trabalho a competência sobre as
controvérsias alusivas à representação sindical (que já eram
conhecidas em caráter incidental, mas não em ação própria
envolvendo os sindicatos interessados), e assim as discussões
envolvendo os sindicatos, nessa qualidade, ainda que não esteja a
controvérsia originada em norma coletiva de trabalho. Com efeito, a
restrição da Lei nº 9.028/1995 não mais se configura ante o
preceito constitucional contido no inciso III do artigo 114, cabendo
notar, contudo, que as lides envolvendo sindicatos, ou entre estes e
trabalhadores ou empregadores, deve ter em consideração a discussão
de tema ligado a direito sindical ou à relação entre sindicatos e
trabalhadores ou patrões.
A competência, no caso,
se estabelece pela natureza das pessoas envolvidas, a exigir a
qualidade da pessoa jurídica como sindicato e, doutro lado, quando
for o caso, como patrão ou trabalhador, não bastando que a ação
envolva o sindicato se a condição que se aperfeiçoa é distinta,
assumindo qualificativo diverso algum dos envolvidos na relação
jurídico-processual.
Também
as discussões alusivas à representação sindical, ainda que não
figurando o sindicato como parte, são, doravante, da competência
exclusiva da Justiça do Trabalho. Há que se notar que, no
particular, a competência se revela pela matéria e não pelas
pessoas envolvidas na lide, não por menos a razão da segunda parte
do dispositivo, a estabelecer que outros conflitos, fora da discussão
representativa, se partes os sujeitos descritos, nessa qualidade
(sindicato, patrão, trabalhador), são da competência da Justiça
do Trabalho. No contexto da “representação
sindical”,
ademais, inclui-se não apenas a representação do sindicato em
relação a terceiros, como ainda a representação dos dirigentes
sindicais, que manifestam aquela, para também compreender-se,
portanto, a regularidade da escolha e da atuação da direção e
órgãos sindicais. Não por menos, o STJ decidiu por não mais
aplicar a Súmula 4/STJ para definir, por unanimidade, ser doravante
a Justiça do Trabalho a competente para casos envolvendo o processo
eleitoral sindical, por pertinente à representação sindical.
Denota,
pois, que o artigo 114, inciso III, da Constituição revela, na
primeira parte, nítida competência material (discussão de
representação sindical) e, na segunda parte, nítida competência
pela pessoa dos litigantes (lides entre sindicatos, ou entre
sindicatos e trabalhadores ou patrões, nessa qualidade). Nesse
sentido, como antes dito, não importa que a discussão envolva
sindicatos de servidores ou empregados públicos, já que a
competência resta unificada no âmbito da Justiça do Trabalho. Ou
seja, todas as discussões de direito sindical passam a ser
unicamente da competência da Justiça do Trabalho, a teor do artigo
114, inciso II, da Constituição vigente conforme a redação dada
pela Emenda Constitucional nº 45/2004, quando enuncia que àquela
cumpre processar e julgar “as
ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre
sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores”.
d) competência
para processar e julgar mandados de segurança, “habeas corpus” e
“habeas data”, quando o ato questionado envolver matéria sujeita
à jurisdição da Justiça do Trabalho (art. 114, inciso IV):
A
Emenda Constitucional nº 45/2004, ao definir a competência da
Justiça do Trabalho para processar e julgar “os
mandados de segurança, habeas
corpus
e habeas
data,
quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua
jurisdição”,
acabou por alterar a disciplina secular do mandado de segurança, do
habeas
corpus
e do habeas
data,
deslocando o eixo de definição competencial antes pela pessoa da
autoridade ou do sujeito ssa
qualidade, o artigo 59, parpendendo dos demais trnstitucional,
enquanto o texto a sre que, permanecendo se o texto a ser iindicado
como coator para o tema discutido no ato questionado, ainda quando
envolvido, apenas, tema pertinente à jurisdição própria da
Justiça do Trabalho.
A
competência da Justiça do Trabalho em sede de mandado de segurança
derivava diretamente do contido no artigo 21, inciso VI, da LOMAN –
Lei Complementar nº 35/1979. Com isso, a competência era limitada
ao exame dos mandados de segurança impetrados contra atos
administrativos oriundos dos Tribunais do Trabalho ou contra decisões
judiciais prolatadas pela Justiça do Trabalho, desde que inexistente
recurso ou via correicional para seu exame. No caso do habeas
corpus,
a inexistência de lei resolvera-se pela construção jurisprudencial
para enquadrar os atos envolvendo prisão civil como de competência
da Justiça do Trabalho, não obstante os constantes conflitos de
competência que se seguiram com a Justiça Federal por conta do
artigo 108, inciso I, alíneas “a” e “d”, da Constituição.
Em relação ao habeas
data,
que apesar do nome guarda inequívoca correlação com o instituto do
mandado de segurança, o remédio era adotado na linha descrita pela
LC 35/1979, apenas quando a informação postulada estava contida em
registro ou banco de dados da própria Justiça do Trabalho, e assim
negada, entendia-se possível a regra de processo e julgamento por
esta Justiça Especializada.
Essa era, portanto, a
situação decorrente da redação precária do original artigo 114
da Constituição Federal.
Com
a EC 45/2004, contudo, o campo foi ampliado para definir que, se o
ato questionado envolve matéria ordinariamente sujeita à sua
jurisdição, ou disso decorre, a competência é da Justiça do
Trabalho para o processo e julgamento das descritas garantias
constitucionais. Doravante, pois, ainda que como impetrado esteja
sujeito diverso de Juiz ou Tribunal do Trabalho e desde que a matéria
esteja dentre aquelas elencadas nos demais incisos do artigo 114 da
Constituição, ou dela seja decorrente, a competência para
processar e julgar o mandado de segurança, o habeas
corpus
e o habeas
data
será da Justiça do Trabalho, inclusive do Juiz do Trabalho de
primeira instância, juiz natural quando não estabelecida, por
paradigma constitucional ou norma legal, a competência funcional
peculiar dos Tribunais do Trabalho. Assim, persiste, por força do
artigo 21, IV, da LC 35/1979, a competência dos Tribunais do
Trabalho para apreciar os mandados de segurança contra seus próprios
atos, e assim dos Tribunais Regionais quando a autoridade cominada
como coatora seja Juiz do Trabalho, mas estabelece-se agora, também,
a competência dos Tribunais para o exame dos atos cuja matéria
envolvida esteja descrita no artigo 114 da Constituição, usando
como paralelo o deslocamento dos dispositivos contidos nos artigos
102, 105 e 108 da Constituição Federal, remanescendo os demais a
cargo da autoridade dos Juízes do Trabalho, como juízo residual
especializado. Por isso, se o ato envolver matéria sujeita à
jurisdição trabalhista, mas estiver a autoridade impetrada dentre
aquelas delineadas pelo artigo 102, I, “d”, da Constituição, a
ressalva persiste a atribuir ao Supremo Tribunal Federal a
competência para processar e julgar o writ.
No entanto, por paralelismo, se for a autoridade impetrada Ministro
de Estado ou Comandante da Marinha, do Exército ou da Aeronáutica,
ou o Tribunal Superior do Trabalho, a regra de competência se
estabelece em favor do próprio TST; se for o ato questionado
atribuído a Tribunal Regional do Trabalho ou a Juiz do Trabalho, a
competência se estabelece em favor do próprio TRT; e nos demais
casos, sempre que discutida matéria própria da Justiça do
Trabalho, a competência será do Juiz do Trabalho. No mesmo sentido,
se a informação pretendida originar-se da relação de trabalho ou
das demais competências da Justiça do Trabalho e restar pretendida
pela via do habeas
data,
que segue a mesma regra de distribuição funcional que o mandado de
segurança, conforme delineado pela Constituição Federal.
Por
fim, com relação ao habeas
corpus,
além de suplantar-se a discussão acerca da competência para
processar e julgar aqueles impetrados contra ato de Juiz ou Tribunal
do Trabalho, quando envolvida prisão de depositário infiel, o
dispositivo constitucional abre caminho para o alargamento da
competência quando o constrangimento ao direito de locomoção
decorrer da relação de trabalho, por prática de ato ilegal ou de
abuso de poder, pelos sujeitos de tal relação, em detrimento um do
outro, sem prejuízo da repercussão posterior no âmbito criminal,
em caso de eventual crime para constranger outrem no direito de
locomoção. Há que se notar que o artigo 114, IV, da Constituição,
inserido pela EC 45/2004, estabelece uma ressalva especial em relação
à competência doutros Juízos e Tribunais em sede de habeas
corpus,
sempre que envolvida discussão pertinente à própria jurisdição
da Justiça do Trabalho ou ato dela decorrente, sem adentrar em campo
de exercício de jurisdição criminal. Nesse sentido, pois, a prisão
civil ou administrativa decretada por Juiz ou Tribunal do Trabalho
passa a ser examinada, em sede de habeas
corpus,
pelo Tribunal Regional do Trabalho, se a autoridade dita como coatora
for Juiz de primeira instância, pelo Tribunal Superior do Trabalho,
se for membro de TRT ou se a suposta coação decorrer de ato do
próprio TRT (por paralelismo com a regra inserida no artigo 105, I,
“c”), e pelo Supremo Tribunal Federal, quando a suposta coação
advir de Ministro do TST ou do próprio Tribunal Superior (artigo
102, I, “i”). De todo modo, também há que se considerar a
possibilidade de configurar-se o constrangimento que não decorre de
ato de Juiz ou Tribunal do Trabalho no exercício de sua jurisdição,
resultante da ameaça ou coação ao direito de ir e vir por
ilegalidade ou abuso, cometido por trabalhador ou patrão, no âmbito
da relação de trabalho. A hipótese de habeas
corpus
impetrado contra ato de particular, embora se vislumbre antes a
hipótese de atuação policial ou administrativa, tem sido admitida
pela doutrina e pela jurisprudência quando o sujeito desprovido de
autoridade pública esteja a causar restrição ou a perturbar o
exercício pleno do direito de locomoção de outrem, tanto mais
quando se demonstre pela repetição da prática ou por
circunstâncias especiais que a ordem judicial para a liberação do
retido ou o salvo-conduto para inibir retenção posterior se mostre
como a medida mais rápida e eficiente para que cesse a coação ou a
ameaça ao direito de ir e vir. Ou seja, o habeas
corpus
pode ser requerido contra qualquer sujeito que, autoridade ou não,
assuma a posição de coator ao direito de locomoção de outrem, por
ato efetivo ou ameaça, inclusive porque, diferentemente do mandado
de segurança, o constituinte não perfez qualquer restrição à
exigência de ato de autoridade, pelo que circunscrito o objeto à
existência de coação ou ameaça ao direito de ir e vir, conforme a
doutrina e específico precedente do Colendo Superior Tribunal de
Justiça. Nesse sentido, no campo da jurisdição trabalhista, por
exemplo, tem-se o caso de constrangimento no curso de movimento
paredista para impedir trabalhadores que não pretendam aderir à
greve de adentrar na empresa ou dela se retirarem ao final de
expediente, para compelir à adesão ao movimento grevista, caso em
que se poderia ter coligado o motivo do abuso ou da ilegalidade à
relação de trabalho e ao exercício do direito de greve, descritos
na competência da Justiça do Trabalho, a atrair, assim, também a
competência para decidir os habeas
corpus
impetrados em favor de tais sujeitos colocados em situação de
violência ou coação em sua liberdade de locomoção, real ou
potencial (ameaça). Também, como outro exemplo, a situação
vexatória de revistas à saída das empresas, ou de deter-se alguém
para que confesse ou deponha sobre determinado fato concernente à
relação de trabalho, ou ainda para persistir trabalhando em
condição análoga à de escravo. Tudo isso, logicamente, sem
desfigurar a ocorrência de crime praticado pelo coator, a ser
representado à autoridade competente, para eventual processo e
julgamento pela Justiça Comum, federal ou local, conforme decorre do
artigo 40 do Código de Processo Penal. Nem sempre, pois, o
constrangimento decorre de ato de autoridade, mas também por conta
de abuso ou ilegalidade cometida por particular em relação a
outrem, inclusive nas relações de trabalho ou noutras de
competência, doravante, da Justiça do Trabalho. Nesses casos, há
que se notar que o Juiz ou Tribunal do Trabalho poderia emitir
comando inibitório ao coator, determinando uma obrigação de
não-fazer, no seio de via ordinária, pelo que não se admite o
deslocamento da competência para tal comando apenas pelo uso da
garantia constitucional do habeas
corpus,
quando o salvo-conduto ou a ordem de liberação dos pacientes
indevidamente retidos efetivada se relacione a ato ou fato
jurisdicionado pela Justiça do Trabalho, a teor do artigo 114 da
Constituição.
e) processo e
julgamento de conflitos de competência envolvendo órgãos da
própria Justiça do Trabalho (art. 114, inciso V):
No concernente ao inciso
V acrescido ao artigo 114 pela EC 45/2004, pretendeu o constituinte
derivado suplantar as discussões acerca da inadequada redação do
artigo 105, I, “d”, da Constituição, que parecia entregar ao
Superior Tribunal de Justiça a competência para processar e julgar
todos os conflitos envolvendo tribunais e juízos a ele não
vinculados, ou entre juízos vinculados a tribunais diversos,
ressalvada a competência para conflitos própria do Supremo Tribunal
Federal. A redação deficiente do referido dispositivo levou, por
vezes, conflitos de competência envolvendo juízos ou tribunais do
trabalho serem deslocados para o STJ, quando o foro próprio seria o
Tribunal Regional do Trabalho ou o Tribunal Superior do Trabalho,
desde que envolvidos apenas órgãos com jurisdição trabalhista,
inclusive assim os Juízes de Direito quando dela investidos nas
comarcas desprovidas de Juízo do Trabalho. Não por menos, o
Superior Tribunal de Justiça acabou por editar a Súmula 236/STJ
que, não obstante, foi insuficiente a descaracterizar a precariedade
do dispositivo constitucional.
Por isso, a norma
expressa que doravante e indubitavelmente atribui aos Tribunais do
Trabalho (TRTs ou TST, conforme o caso) o processo e julgamento dos
conflitos de competência envolvendo os órgãos da Justiça do
Trabalho, ou os Juízos de Direito enquanto investidos de jurisdição
trabalhista, ressalvando apenas a competência do Supremo Tribunal
Federal quando um dos órgãos em conflito for Tribunal Superior.
Logicamente, como não se admite conflito entre tribunal superior e
tribunal ou juízo inferior, o comando remanescente contido no artigo
102, I, “o”, da Constituição, admite perante o Supremo Tribunal
Federal o processo e julgamento, em caráter originário, do conflito
envolvendo Juízo ou Tribunal Regional do Trabalho (e inclusive o
Juízo de Direito enquanto investido de jurisdição de trabalhista)
e Tribunal Superior que não seja o TST, ou do conflito envolvendo o
Tribunal Superior do Trabalho e outro Juízo ou Tribunal que não
seja detentor de jurisdição trabalhista já que a decisão do
Tribunal Superior do Trabalho, em questão de competência envolvendo
qualquer Tribunal ou Juízo investido de jurisdição trabalhista,
não admite conflito com o Tribunal ou Juízo recalcitrante –
nesses casos, cabe dizer, os conflitos sequer são conhecidos por
inadmissíveis, já que se estabelece, segundo diversos precedentes
do Supremo Tribunal Federal, questão de nítida hierarquia
jurisdicional e não de conflito de jurisdição ou de competência.
Deste modo, excluído o conflito instaurado pelo Juízo ou Tribunal
do Trabalho recalcitrante, resta doravante clara a regra de que cabe
aos Tribunais Regionais ou ao Tribunal Superior do Trabalho apreciar
os conflitos de competência envolvendo órgãos da Justiça do
Trabalho ou investidos de jurisdição trabalhista, ressalvada apenas
a competência do Supremo Tribunal Federal para apreciar os conflitos
envolvendo o Tribunal Superior do Trabalho e outro Tribunal Superior
ou Juízo ou Tribunal não investido de jurisdição trabalhista.
f) competência as
controvérsias envolvendo pedido de indenização por dano moral ou
patrimonial decorrente da relação de trabalho (art. 114, inciso
VI):
O inciso VI, quando lido
em seguida ao inciso I, do artigo 114 da Constituição, conforme
decorrem da EC 45/2004, parece conduzir a uma impropriedade eis que
os limites dos pedidos específicos concernentes a indenizações por
dano moral ou material (patrimonial) decorrentes da relação de
trabalho já parecem estar incluídos nas ações que se originam de
tais específicas relações. Há uma premissa basilar da
interpretação constitucional que conduz a não considerar palavras
inúteis na Constituição, sobretudo pelo conjunto sistêmico que
decorre do ordenamento normativo supremo que nela se traduz. Por
isso, há que se buscar, para delimitar o alcance pretendido pelo
constituinte derivado, o conteúdo que decorre da análise
sistemática da Constituição, baseado, sobretudo, no princípio da
utilidade dos termos aparentemente em repetição ou inúteis. A
análise do processo legislativo, inclusive nos bastidores
não-oficiais, revela que a preocupação concernente ao dispositivo
principal da competência da Justiça do Trabalho, exatamente o
inciso I, fruto do desdobramento e ampliação do texto antes contido
no próprio caput do artigo 114 da Constituição, levou à inserção,
no rol descrito, doutros dispositivos que revelassem, como revelam, o
alcance material da nova competência entregue à Justiça
Especializada, sobretudo no caso de impasses para a materialização
da norma principal, assim emergindo os incisos VI e IX. Com isso, há
que se considerar o inciso VI como complemento à norma contida no
inciso I do artigo 114 da Constituição, de modo a enunciar aspecto
específico que, fosse inserido no dispositivo principal, poderia
resultar na perda de logicidade ou no aumento da extensão do texto
necessário a conduzir à compreensão do intérprete. De todo modo,
nesse particular aspecto complementar, a questão alusiva à
competência ampla para apreciar os pedidos de indenização por dano
decorrente da relação de trabalho faz atribuir, inequivocamente, à
Justiça do Trabalho, conforme já vinha sendo construído pela
jurisprudência, as controvérsias alusivas a tais pedidos
indenizatórios fundados em acidente de trabalho, já que envolvem
inclusive os partícipes da relação laboral, sem confundir com
aquel’outra controvérsia com fato pertinente ao seguro pelo
acidente e que envolve a autarquia previdenciária, excluída da
competência da Justiça Federal por força do artigo 109, I, da
Constituição, que enseja, doutro lado, a correção legislativa
para também transferir-se à Justiça do Trabalho, conquanto
atualmente atribuída à Justiça Local, conforme admite o inciso IX
do artigo 114 da Constituição.
Nesse
particular, a referência expressa contida na exceção descrita da
competência federal comum exige do legislador a opção de
transferir à Justiça do Trabalho, inequivocamente, a discussão
ampla do acidente de trabalho para também contemplar a situação
meramente securitária que, cabe sempre repetir, não se pode
confundir com o pedido indenizatório que envolve as partes da
relação laboral já que, logicamente, não estariam entregues à
jurisdição da Justiça Federal e, pois, não podem ser incluídos
na exceção descrita, tanto mais agora a partir do efeito
esclarecedor da norma do artigo 114, VI, da Constituição. Por isso,
o inciso VI do artigo 114 da Constituição, em verdade, enquanto
pretendeu apenas revelar que qualquer indenização, seja de cunho
moral ou material, se decorrente da relação de trabalho, está
doravante entregue à jurisdição da Justiça do Trabalho, reforça
a norma geral contida no inciso I de modo a consagrar a
aplicabilidade de qualquer norma jurídica à relação de trabalho,
inclusive aquelas para o exame específico da indenização por dano
moral ou material, ainda que distintas da norma que regula a relação
específica a ser examinada, com isso sinalizando a inequívoca
competência deste ramo especializado para todas as questões
envolvendo dano material ou material decorrente da relação de
trabalho, assim, pois, dentre outras, as que envolvem a perseguição
de indenização com base em acidente de trabalho por culpa lato
sensu
do empregador. Emerge, dessa acepção, que o que se construíra
jurisprudencialmente acaba por conseguir o reforço da norma
constitucional no sentido de consagrar a ampla competência da
Justiça do Trabalho para todas as questões de trabalho, ainda que
com amparo em legislação civil ou especial, decorrente da relação
de trabalho, quando o pedido detém natureza indenizatória
concernente a dano moral ou material sofrido por qualquer das partes
envolvidas na relação laboral.
Cabe notar, nesse
particular, que não há pedidos comuns ou fatos idênticos de uma
mesma relação processual entre a causa envolvendo os partícipes da
relação laboral, pertinente à apuração de eventual
responsabilidade subjetiva e indenização por dano moral ou
patrimonial, e aquel’outra causa envolvendo necessariamente o
trabalhador, como securitário, e a autarquia previdenciária, para o
fim de apuração da responsabilidade objetiva e concessão do
benefício securitário à vítima de acidente de trabalho. Os dois
fatos, com a devida vênia, são distintos e devem encontrar foco
diverso, ainda que a temática do acidente possa ser similar.
Nesse
sentido, reformulando posição jurisprudencial anterior, o STF
acabou por decidir, ao apreciar o CC 7204/MG, pela competência
absoluta da Justiça do Trabalho para apreciar os casos envolvendo
acidente de trabalho, quando envolvidos os partícipes da relação
laboral, inclusive tendo sido proferido votos no sentido de
compreender pela competência mais ampla, inclusive para os casos
envolvendo o seguro acidentário a cargo da autarquia previdenciária,
no contexto de que também revela indenização por acidente de
trabalho. Tudo isso revela que o artigo 114, inciso VI, da
Constituição Federal, assume nova dimensão para a fixação da
competência da Justiça do Trabalho, além dos campos antes
restritos do Direito do Trabalho. Como disse alhures, a Justiça do
Trabalho tem significado além das normas infraconstitucionais, tem
expressão na relação capital-trabalho e nas relações coligadas
ou decorrentes das relações de trabalho, independentemente da norma
de regência.
g) competência
para o exame das penalidades administrativas impostas aos patrões
pela fiscalização do Trabalho (art. 114, inciso VII):
O inciso VII do artigo
114 da Constituição, conforme inserido pela EC 45/2004, atribuiu à
Justiça do Trabalho competência antes entregue à Justiça Federal.
Com efeito, as
penalidades administrativas impostas pela fiscalização do trabalho,
por envolver interesse federal, eram entregues ao controle
jurisdicional por parte da Justiça Federal, ante a norma descrita no
artigo 109, inciso I, da Constituição. No entanto, com a expressa
definição constitucional de serem tais penalidades, doravante,
sujeitas ao controle jurisdicional da Justiça do Trabalho, revela-se
a exceção contida na parte final do artigo 109, I, da Constituição
para inibir qualquer medida perante a Justiça Federal, inclusive por
via excepcional de ação de garantia constitucional, por força da
norma contida no artigo 114, IV, da Constituição, que passou à
competência da Justiça do Trabalho os mandados de segurança quando
o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição.
Com isso,
independentemente da via processual eleita pelo interessado, a
discussão de penalidade administrativa que tenha sido aplicada ao
empregador pela fiscalização do trabalho será da competência da
Justiça do Trabalho. Há que se notar que não funcionará a Justiça
do Trabalho como grau revisor de tais penalidades administrativas
porque o interessado deve valer-se de ação para discuti-las perante
o Juízo Laboral ou Tribunal do Trabalho, seja por ação ordinária,
seja por mandado de segurança contra o ato da autoridade
administrativa competente. Desde logo, a teor do artigo 626 e
seguintes da CLT, cabe perceber que não necessariamente a
fiscalização será aquela operada apenas pelo Ministério do
Trabalho, podendo também revelar-se na que se exerce pelo Ministério
da Previdência Social quanto à autuação por inobservância da
legislação pertinente às relações de trabalho. Nesse contexto há
que ser compreendida a locução ampla “fiscalização do
Trabalho”.
Assim, se a autuação
ocorre por conta de fiscalização que perceba inobservância do
empregador às normas de controle dos recolhimentos fiscais, por
exemplo, por próprias às relações de trabalho, cumprirá à
Justiça do Trabalho avaliar a correção ou não da penalidade
aplicada, sem discutir, por conta disso, matéria previdenciária,
mas apenas a adequação burocrática dos registros e recolhimentos
exigidos pela legislação protetora do trabalho. De igual modo, a
fiscalização do trabalho, por compreender não apenas a burocracia
dos registros trabalhistas, mas também a observância a regras
próprias de conduta no âmbito da higiene, medicina e segurança do
trabalho, atrai para a competência da Justiça do Trabalho, também,
o exame das penalidades aplicadas em decorrência de conduta
inadequada dos empregadores, assim cabendo avaliar, por via oblíqua,
os preceitos e normas inerentes à relação de trabalho, ainda que
não envolvido trabalhador específico, pelo mero risco à ocorrência
de dano à integridade de qualquer trabalhador.
Aliás,
assim já estava a enunciar o Supremo Tribunal Federal quando, em
2003, editou a Súmula 736/STF, pacificando o entendimento de que
“Compete
à Justiça do Trabalho julgar as ações que tenham como causa de
pedir o descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança,
higiene e saúde dos trabalhadores”.
Logicamente, além de competência para o exame material e valorativo
das penalidades administrativas aplicadas, cumpre doravante à
Justiça do Trabalho também o exame de tais penalidades sob o
aspecto da adequação formal da autuação procedida pelos órgãos
de fiscalização das relações de trabalho, de modo a consolidar
jurisprudência no sentido dos aspectos formais-burocráticos
exigidos para a autuação, como também para definir as exigências
decorrentes da legislação de proteção ao trabalhador, quando da
análise do conteúdo das penalidades em relação aos fatos
noticiados como em desacordo com a legislação reguladora e os
limites dos valores das multas passíveis de serem aplicadas.
h) competência
para a execução, de ofício, das contribuições sociais
decorrentes das sentenças proferidas pela Justiça do Trabalho (art.
114, inciso VIII):
O inciso VIII do artigo
114 da Constituição resulta da transposição do antigo parágrafo
3º do referido artigo, então inserido pela Emenda Constitucional nº
20/1998, de modo a compreender-se no rol enumerativo das competências
próprias da Justiça do Trabalho. A remissão expressa ao artigo
195, I, “a”, e II, da Constituição, resulta na limitação
competencial à execução das contribuições sociais que resultem
do valor que seria agregado à folha de pagamentos dos empregadores,
empresas ou a estes equiparados, por conta do crédito reconhecido em
sentença proferida pela Justiça do Trabalho, assim devidas por tais
sujeitos, como também à execução das contribuições devidas
pelos trabalhadores, sejam empregados ou não, sobre os valores que
lhes forem reconhecidos como crédito trabalhista efetivo. Conforme
já enunciara à época da edição da Lei nº 10.035/2000, que
regulamentara então o parágrafo 3º do artigo 114 da Constituição,
e doravante regulamentará, como regra recepcionada, o descrito
inciso VIII do referido dispositivo constitucional, a competência
que se estabelece emerge apenas na fase de execução do crédito
trabalhista, quando efetivados os créditos trabalhistas, ou ao curso
de tal execução, em caráter subsidiário, não preferindo à
execução dos créditos trabalhistas reconhecidos já que se exige,
antes disso, a efetiva existência de fato gerador previdenciário
consistente na entrega do valor devido ou na existência do crédito
suficiente para tanto em favor do trabalhador.
Cabe enunciar, ainda, que
a locução “de ofício” contida no dispositivo constitucional,
como já antes pronunciara, resulta na inserção dos valores
previdenciários apurados como decorrentes do crédito trabalhista em
execução, para o recolhimento voluntário ou para as retenções de
ofício, sem inibir a atuação da autarquia previdenciária
responsável no concernente à definição das bases de cálculo e
alíquotas incidentes no cálculo, bem como para a devida indicação
do modo de efetivação da execução instaurada de ofício, sempre
que a atuação judicial depender de elementos inexistentes nos autos
ou para provocar-lhe a correção de rumos, sobretudo porque a
decisão que homologar e liberar os valores recolhidos tem efeitos de
coisa julgada, a inibir a cobrança de valores suplementares pelo
mesmo fato gerador. Por fim, percebe-se que a competência inserida
em 1998 mereceu a confirmação do constituinte derivado a partir dos
resultados obtidos, que significaram implemento na arrecadação de
valores previdenciários e animaram o Senado Federal a aprovar medida
similar para a execução das multas por infração à legislação
trabalhista e para a execução dos tributos federais sobre os
créditos decorrentes das sentenças que a Justiça do Trabalho
proferir, conforme consta da Proposta de Emenda Constitucional
358/2005 (PEC paralela da Reforma do Judiciário), em análise pela
Câmara dos Deputados.
Não se há que
transmutar a índole da Justiça do Trabalho, contudo, por conta do
inciso VIII do artigo 114 da Constituição, eis que toda a atividade
jurisdicional que lhe é confiada pela Carta Política vigente,
sobretudo a partir da Emenda Constitucional nº 45/2004, tem como
pressuposto ser a guardiã das relações de trabalho e do equilíbrio
entre capital e trabalho, e não ramo tributário ou parafiscal do
Poder Judiciário nacional, eis que tal atividade decorre, sempre, em
caráter subsidiário e dependente das sentenças que forem
proferidas e nos limites dos créditos reconhecidos pela Justiça do
Trabalho.
i) outras
controvérsias decorrentes da relação de trabalho (art. 114, inciso
IX):
O inciso IX do artigo 114
da Constituição consagra texto suplementar que antes estava contido
na parte final do caput do referido dispositivo constitucional.
De
novo, emerge a pergunta: não seriam os anteriores dispositivos
suficientes a enumerar as hipóteses de competência da Justiça do
Trabalho? Entendeu o constituinte ser razoável deixar campo aberto
para a normatização de hipótese que pudesse resultar dúbia ou
para consagrar como de competência da Justiça do Trabalho quaisquer
outras que, por conta de aplicação de interpretação decorrente
doutros dispositivos constitucionais, persistem entregues, de modo
residual, a outros ramos do Poder Judiciário, à falta de
direcionamento explícito à Justiça especializada.
Também
há que se notar que, diferentemente do inciso I do artigo 114, o
inciso IX fala em “outras
controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei”
sem necessariamente exigir ação que a discuta, permitindo, assim, o
campo para envolver, sobretudo, a chamada jurisdição graciosa ou
voluntária, em que não há lide, embora exista controvérsia,
segundo disposto no Código de Processo Civil, artigo 1103 e
seguintes, apresentando o interessado mero requerimento com pedido
dirigido à solução do Juiz, sem formar-se contraditório por falta
de litígio, por isso decidindo o julgador com base na lei ou por
pressuposto de justiça, e ainda os casos que exigem explicitação
normativa das competências distribuídas, como em relação ao
mandado de injunção, expressamente referida a Justiça do Trabalho,
a teor do artigo 105, I, “h”, da Constituição Federal.
Do exame do inciso IX do
artigo 114 da Constituição, pois, é possível concluir pela
ampliação da competência da Justiça do Trabalho para as
controvérsias não propriamente descritas em litígio, assim como
para as questões que a Constituição guardou para a opção do
legislador, tendo por objeto a relação de trabalho, ainda que não
envolvidos os seus partícipes, mas outros sujeitos aos quais
resultam direitos ou obrigações de tais relações trabalhistas,
nos diversos campos jurídicos, assim como também permite a
compreensão doutros dispositivos constitucionais que revelam
competência da Justiça do Trabalho não expressamente enumerada no
artigo 114.
j) dissídios
coletivos (art. 114, parágrafos 2º e 3º):
A
Emenda Constitucional nº 45/2004, ao instante em que manteve o
parágrafo 1º do artigo 114 da Constituição, assinalando que
“Frustrada
a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitros”,
alterou a regra do anterior parágrafo 2º, que consagrava o poder
normativo dos Tribunais do Trabalho, e deu nova redação ao
parágrafo 3º (cuja redação anterior passou a compor o novo inciso
VIII). Com isso, estabeleceu que “Recusando-se
qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é
facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de
natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o
conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção
ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente”
e que, “Em
caso de greve em atividade essencial, com possibilidade de lesão do
interesse público, o Ministério Público poderá ajuizar dissídio
coletivo, competindo à Justiça do Trabalho decidir o conflito.”
Inicialmente, cabe notar
que os referidos parágrafos 2º e 3º do artigo 114 da Constituição
envolvem matéria pertinente ao dissídio coletivo, não
necessariamente concernentes ao exame do exercício do direito de
greve descrito no inciso II do referido artigo constitucional, pelo
que, doravante, a discussão sobre a abusividade de greve pode vir
deslocada da discussão de cláusulas jurídicas ou econômico-sociais
pertinentes a eventual paralisação ou movimento paredista, para
situar-se em campo autônomo, de ação meramente declaratória e não
mais apenas como pedido declaratório incidental. No campo, doutro
lado, dos dissídios coletivos descritos nos parágrafos 2º e 3º do
artigo 114 da Constituição, cabe ser notada uma distinção
peculiar entre as ações descritas num e noutro dispositivo.
No
primeiro caso (§ 2º), o poder normativo dos Tribunais do Trabalho é
admitido em caráter restrito, nos limites apresentados pelas partes,
em petição conjunta, respeitadas as condições mínimas de
proteção ao trabalho descritas em norma legal ou em normas
coletivas anteriores, assim inclusive tendo a Constituição Federal,
por via oblíqua, passado a considerar a integração definitiva dos
direitos ajustados em acordos e convenções coletivas aos contratos
individuais de trabalho, sempre que a própria Constituição não
admita a alteração excepcional dos seus ditames (artigo 7º, VI,
XIII e XIV). Não há mais, pois, campo para considerar a norma
coletiva como de eficácia contida no tempo, dada a regra específica
dos efeitos descritos na parte final do parágrafo 2º do artigo 114,
nem há, igualmente, possibilidade de o Tribunal do Trabalho
extrapolar limites não descritos pelas próprias partes, porque não
estará a Corte, como no modelo constitucional anterior, a
“estabelecer
normas e condições”,
mas apenas a retratar a solução do conflito nos limites postos
pelas partes, segundo as cláusulas que sugerirem num ou noutro
sentido, ou quando menos na adoção de norma de equilíbrio entre as
apresentadas pelos suscitantes, sempre cabendo observar, como ponto
de partida, os direitos já consagrados em lei ou na norma coletiva
antes vigente. Outro aspecto, ainda pertinente ao exame do parágrafo
2º do artigo 114 da Constituição, diz respeito ao alcance da
locução “de
comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica”,
já que, obviamente, a propositura conjunta parece, ao primeiro
instante, desnaturar o contido no artigo 5º, XXXV, também da
Constituição, quando retrata o direito de ação. Não por menos,
já há notícia de ação direta de inconstitucionalidade da
referida locução em contraposição ao artigo 5º, XXXV, da
Constituição, sob o fundamento de ofensa ao direito de ação
porque seria ilógico um sujeito depender do outro para buscar a
solução do conflito perante o Poder Judiciário.
No
entanto, cabe notar que ao instituir nova regra para o dissídio
coletivo econômico, em que a Justiça do Trabalho atua em
substituição à vontade das partes, pretendeu o constituinte
derivado enunciar a importância da negociação coletiva e da
arbitragem, ao instante em que atribuiu inequívoca atuação
arbitral (ainda que anomalamente estatal) pelos Tribunais do
Trabalho, sempre que provocados pelas partes interessadas, que
entregam à jurisdição estatal a decisão sobre o conflito
instaurado, nos termos que apresentam, para decisão, inclusive sob
juízo de eqüidade. A arbitragem privada guarda dupla natureza
jurídica, sendo contratual até a instauração da cláusula
compromissória e depois, instaurada propriamente,
quase-jurisdicional. Em relação à arbitragem pública descrita,
autoriza-se ao Tribunal do Trabalho que já detém jurisdição
ultrapassar os limites fixados pela Constituição e pelas leis para
atuar segundo os limites apresentados pelas partes, analisando as
cláusulas que sugiram e assim decidindo, inclusive, por critérios
de Direito e de Justiça, segundo os reflexos econômico-sociais que
entendam incidentes no caso. Não há dúvidas de que se as partes
envolvem-se em animosidade suficiente a impedir a concretude das
negociações coletivas e da arbitragem propriamente dita poderia
isso também impedir o comum acordo para a propositura do dissídio
coletivo. Mas, ao instante em que o constituinte derivado pretendeu
exatamente evitar a atuação da Justiça do Trabalho no campo
sócio-econômico, senão por vontade das partes, há que se notar
que deixou às partes a decisão sobre a confiabilidade da decisão
acerca do conflito aos Tribunais do Trabalho, que funcionam assim
como órgãos de arbitragem, embora providos de toda a força
inerente à atuação como órgão de Poder do Estado. Não há,
pois, a inconstitucionalidade que se pretende propagar, enquanto
refeita a leitura para denotar um segundo campo de discussão dos
dissídios coletivos, em que os Tribunais do Trabalho se vestem de
uma capa própria, jungidos pela confiança das partes nos critérios
de justiça sócio-econômica que possa assim estabelecer. Ou seja, o
artigo 114, parágrafo 2º, da Constituição, não atingiu o direito
de ação por parte dos sindicatos ou empresas envolvidos no conflito
coletivo à ocasião da data-base, mas definiu que o poder normativo
da Justiça do Trabalho, doravante, apenas se exerce em situação
similar à do juízo arbitral, que depende da vontade das partes
envolvidas para ser instaurado, sem impedir que outras discussões,
como eventual abusividade do movimento paredista, possam ser, doutro
modo, apresentadas para decisão do Tribunal do Trabalho competente.
Há que se perceber, ainda, que o conflito sócio-econômico traduz
mais um dissenso de interesses quanto à construção da norma
coletiva e não a resistência a alguma pretensão deduzida, fundada
em fonte de Direito: no dissídio coletivo de natureza econômica há
a própria construção da norma e não a mera eleição da norma ou
fonte jurídica aplicável ao conflito. A diferença, pois, sinaliza
restar incólume o artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição, eis
que o artigo 114, parágrafo 2º, dirige-se a normatizar situação
anômala, pertinente aos conflitos de interesse no âmbito coletivo
do trabalho. Nesse sentido, a resistência das categorias econômicas
resulta, quando menos, na prorrogação dos efeitos da lei e da norma
coletiva anterior, já que o Tribunal do Trabalho apenas poderá
rever eventual cláusula a partir do conjunto estabelecido, num
indicativo do constituinte de que a melhoria das condições sociais
do trabalhador deve ser o pressuposto lógico da atuação da Justiça
do Trabalho em sede de dissídio coletivo de natureza econômica.
Noto que não há facultatividade para a propositura em comum acordo
pelas partes em litígio, a admitir-se a propositura em caráter
singular sem ao menos a adesão posterior da parte contrária, logo
que citada, eis que a locução “é
facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo”
diz respeito à própria instauração do dissídio coletivo de
natureza econômica e não ao trecho secundário de que a
facultatividade residiria apenas no ajuizamento por ambas as partes.
A propositura em comum acordo, portanto, pode traduzir-se por ação
desde logo subscrita por ambos os sindicatos ou decorrer da adesão
ou não-resistência do suscitado ao dissídio coletivo instaurado em
caráter singular pelo outro envolvido no litígio, mas jamais pela
deflagração decorrente apenas da vontade de um dos envolvidos no
litígio sócio-econômico. Aliás, a anterior redação do artigo
114, § 2º, da Constituição Federal já enunciava ser “facultado
aos respectivos sindicatos ajuizar dissídio coletivo”,
demonstrando o exercício do direito de ação como facultativo,
contexto que perdura após a exigência constitucional do dissídio
ajuizado por comum acordo.
Com relação ao segundo
caso de dissídios coletivos (§ 3º), não quis o constituinte,
doutro lado, deixar que interesses privados ou restritos às
categorias envolvidas pudessem confrontar-se com a preponderância de
interesses gerais e públicos, como na ocorrência de greve em
atividade considerada essencial. Nessa hipótese, o Ministério
Público do Trabalho, como representante da sociedade atingida, passa
a ser a única parte legitimada, cabendo ao Tribunal do Trabalho
competente decidir a questão, resolvendo sobre a eventual
abusividade e necessidade de retorno ao trabalho, sem poder
estabelecer, doutro lado, normas pelo exercício de poder normativo,
para tal hipótese não admitida doravante pela Constituição
Federal, exceto se as partes suscitadas, ao responderem, apresentarem
as cláusulas que sejam o objeto da controvérsia que resultara na
paralisação em atividade essencial. Isso porque, se as partes,
eventualmente, silenciarem, não haveria cláusulas em discussão e
nem por isso poderia o Tribunal estabelecer aquelas que considerasse
razoáveis para transpor a paralisação, senão o decreto da
declaração de abusividade ou de não-abusividade, com os efeitos
decorrentes, entregando às partes em conflito a decisão sobre
paralisar ou não o movimento, ante as penalidades aplicáveis em
caso de desobediência à ordem judicial. No entanto, nessa atuação
excepcional de salva-guarda da sociedade, o Ministério Público do
Trabalho não pode envolver-se sobre a conveniência do movimento
paredista ou de sua resistência, mas apenas pode situar a discussão
nos limites do interesse público geral para o restabelecimento de
atividade essencial à sociedade. Ou seja: o parágrafo 3º do artigo
114 da Constituição constitui, na forma da Lei Complementar nº
95/1998, exemplificativo do artigo 114, inciso II, enquanto o
parágrafo 2º do artigo 114 traduz exceção e limitador ao disposto
no artigo 114, inciso I. Mas a seqüência dos parágrafos do artigo
114 da Constituição e a denominação comum de “dissídio
coletivo” traduz que a intervenção do Ministério Público do
Trabalho em dissídio por greve, à conta do artigo 114, § 3º, não
impede que as partes suscitadas apresentem as cláusulas para decisão
pelo Tribunal competente nos limites do artigo 114, § 2º, nem,
igualmente, a instauração do dissídio coletivo na forma do artigo
114, § 2º, pelas partes envolvidas, não impede que o Ministério
Público, na salvaguarda do interesse público, intervenha perante o
Tribunal para pedir a conversão em dissídio de greve e a decisão
que impeça a lesão ao interesse público por conta do movimento
paredista em atividade essencial.
Não há dúvidas de que
os parágrafos 2º e 3º do artigo 114 da Constituição resultaram
em significativa diminuição das hipóteses de cabimento dos
dissídios coletivos, sejam propostos pelas próprias partes em
conflito (assim ensejando a instituição de verdadeiro juízo
arbitral público por órgão jurisdicional trabalhista: o TRT ou o
TST, conforme o caso), sejam propostos pelo Ministério Público do
Trabalho, no caso de greve em atividade essencial e possibilidade
inequívoca de lesão ao interesse público, com redução do campo
de atuação do poder normativo dos Tribunais do Trabalho, ao
instante em que, com isso, restabelece a EC 45/2004 a premissa básica
da negociação coletiva ou da arbitragem privada para os ajustes
entre as categorias e o respeito, no exercício do direito de greve,
aos interesses gerais da coletividade, de modo a inibir o abuso sem
prejudicar o movimento paredista legítimo e consagrado pelos
trabalhadores como expressão de luta por melhoria nas condições de
trabalho. De todo modo, há que se notar que as restrições
descritas não impedem o ajuizamento dos dissídios coletivos de
natureza jurídica, ainda que sem contar com a propositura consensual
dos interessados, já que a vedação descrita pelo parágrafo 2º do
artigo 114 da Constituição circunscreve-se aos efeitos econômicos
da instauração conjunta, mas não impede que desdobramentos
interpretativos sejam objeto de discussão noutros dissídios, assim
como, também, os efeitos resultantes da instauração por proposta
do Ministério Público do Trabalho, descrita no artigo 114,
parágrafo 3º, não pode sinalizar a derrocada do dissídio coletivo
de natureza jurídica, também nestas hipóteses, inclusive a teor do
antes comentado inciso II do artigo 114 da Constituição Federal.
l) conclusão:
A Emenda Constitucional
nº 45/2004 alterou todas as perspectivas dadas à Justiça do
Trabalho quando do início da Reforma do Judiciário, em 1992: de
ramo quase extinto ou fundido com outros àquele com maior gama de
competências recebidas, ampliado o rol para restabelecer o conceito
de responsável pela jurisdição das relações de trabalho e de
todos os conflitos e controvérsias decorrentes, e não mais apenas
os conflitos relativos aos vínculos de emprego ou de pequenas
empreitadas, alcançando agora, inclusive, competências especiais no
campo parafiscal e da fiscalização do trabalho, com controle
específico da atuação administrativa junto a empregadores no campo
da higiene, segurança e medicina do trabalho. É certo que perdem os
Tribunais do Trabalho parte significativa do poder normativo que lhes
era confiado, mas estabelece-se premissa de maior significância aos
pronunciamentos da Justiça do Trabalho quando percebida a ampla
competência em direito sindical e nos casos envolvendo o exercício
do direito de greve, ou suas conseqüências em relação aos
interesses gerais e maiores da sociedade, numa atuação que deve
pautar-se, ainda mais, pelo equilíbrio em restabelecer as atividades
essenciais à normalidade enquanto conduzam as categorias em litígio
à aceitação das decisões normativas nos casos em que ainda
admitidas.
O artigo 114 da
Constituição, a partir da EC 45/2004, revela-nos a alteração
doutros conceitos seculares, alguns de Direito do Trabalho, outros da
processualística, como ao dispor sobre as ações de garantia
constitucional, e denota a importância que emerge de seus
dispositivos não apenas para o âmbito restrito da jurisdição
trabalhista, alcançando também outros ramos do Poder Judiciário
nacional. A confiança do constituinte derivado na Justiça do
Trabalho é significativa e não pode ser frustrada, como símbolo da
vontade do Povo brasileiro, que espera, sobretudo deste ramo
judiciário especializado, a resposta a suas aflições e anseios de
justiça num Estado verdadeiramente de Direito.
A Reforma do Judiciário,
com efeito, não resta concluída pela promulgação da Emenda
Constitucional nº 45/2004, nem ainda estará com a conclusão do
exame da PEC paralela pelo Congresso Nacional (Proposta de Emenda
Constitucional nº 358/2005, em tramitação na Câmara dos
Deputados), dependendo, em muitas situações, de regramentos novos
no âmbito processual material. Mas, para além disso, a Reforma do
Judiciário apenas conseguirá os efeitos almejados por todos quando
os próprios magistrados perceberem que tudo agora é apenas o início
de novos rumos, sem ter medo de trilhar o caminho novo.
Para a Justiça do
Trabalho, principalmente, são muitas as novas trilhas a serem
exploradas.
Brasília, janeiro de 2013.